Quando a falta de acesso ao medicamento é o pior sintoma
*Por Dr. Alexandre Vieira
“Medicamentos não funcionam em pacientes que não os tomam”, C. Everett Koop.
Embora a frase do famoso cirurgião pediátrico norte-americano pareça óbvia, e tenha
se tornado conhecida na década de 1980, ainda reflete um dos maiores problemas de
saúde no mundo. A adesão a medicamentos é uma preocupação crescente para
médicos e sistemas de saúde devido a evidências crescentes de que a baixa adesão
esteja associada a desfechos adversos e maiores custos com saúde.
A Associação Médica Americana define que um paciente é considerado aderente ao
tratamento se tomar 80% de seus medicamentos prescritos. Nos Estados Unidos,
estima-se que 30% das prescrições médicas nunca são dispensadas e, em média,
50% dos medicamentos indicados para doenças crônicas não são tomados
corretamente. Anualmente, a baixa adesão ao tratamento medicamentoso é
responsável por 11% das internações e 125 mil mortes no país norte-americano, além
de gerar custos estimados de US$ 100 a US$ 300 bilhões.
Como primeiro passo para melhorar a adesão, é preciso que haja um reconhecimento
amplo do problema e, uma vez identificado, estratégias simples devem ser
implementadas na prática diária. Gestores de benefícios estão estrategicamente
posicionados para influenciar a adoção de serviços que promovam melhor acesso e
qualidade nos cuidados de saúde, incluindo adesão à medicação.
Em termos práticos, investir no acesso a medicamentos é também uma forma de
prevenção. Para as empresas, significa economia. Segundo o Instituto Brasileiro de
Defesa ao Consumidor, quando as companhias enxergam que o investimento para
auxiliar o colaborador a seguir o tratamento recomendado pelo médico é baixo, e
passam a apoiá-lo, percebem redução do absenteísmo, aumento da produtividade,
redução de custos e de sinistralidade.
O uso inteligente dos dados e informações indicam o caminho certo na gestão de
saúde. Hoje, já existem produtos que irão gerar melhoria na qualidade de vida e
redução de custos, garantido o medicamento certo para o paciente certo. As principais
oportunidades em que o benefício farmácia pode melhorar a adesão ao tratamento
medicamentoso incluem:
- Redução de custo dos medicamentos
Existem evidências sólidas na literatura médica de que a redução de custos aumenta a
adesão ao tratamento medicamentoso. Uma das principais oportunidades neste
sentido é a avaliação farmacêutica para a substituição de determinados medicamentos
por genéricos. A economia pode chegar a 70% para alguns produtos. - Orientação farmacêutica
O uso de múltiplas medicações e complexidade do tratamento tem se tornado uma
realidade cada vez mais presente devido ao envelhecimento populacional e maior
número de doenças crônicas. A complexidade do tratamento é a responsável direta
por diminuir a adesão ao tratamento. Já os programas de entrega domiciliar de
medicamentos aumentam a aderência ao tratamento em até 5,5 vezes quando
comparado a população de pacientes crônicos sem este benefício. Além disso,
pacientes que contam com a entrega em suas residências (normalmente gerenciados
por farmacêuticos) reduzem custos, aumentam a conveniência e não se expõem em tempos de pandemia. O apoio e a coordenação farmacêutica têm se mostrado cada vez mais efetivo no aumento à aderência, inclusive devido à redução de efeitos colaterais. - Monitoramento pelo uso de dados – Fatores como esquecimento ou cálculo errado de doses estão entre os principais motivos para a baixa adesão ao tratamento medicamentoso. O monitoramento através de dados de consumo pode permitir a intervenção precoce em pacientes não aderentes. Existem mecanismos que podem ajudar o paciente com esta tarefa, inclusive com teor educativo para maior empoderamento de sua condição de saúde. Além disso, o uso inteligente de dados, através de algoritmos, pode identificar e coibir fraudes.
Diante da realidade enfrentada pelos brasileiros para aderir a tratamentos médicos,
facilitar o acesso dentro da própria empresa pode representar uma grande mudança
de vida para os seus colaboradores. É preciso desmistificar o fato de que benefícios
farmácia só cabem nos orçamentos de grandes corporações. Hoje, há opções para
todos. E a democratização do uso de medicamentos pode começar agora.
*Dr. Alexandre Vieira é Chief Medical Officer da Funcional Health Tech e membro
do Comitê Técnico da Aliança para Saúde Populacional (ASAP). Ele é médico
intensivista, com MBA em Administração Hospitalar e Sistemas de Saúde, e em
Machine Learning e Big Data, ambos pela FGV. Tem ampla experiência em
consultorias voltadas a hospitais e prestadores de serviços de saúde.